domingo, 5 de julho de 2015

05/07/2015                                   DIVAGAÇÕES.

Divagações. De vaga sons. Sons de vagas. Sons de ondas às vezes tormentosas, às vezes amenas. De ondas tormentosas, o lamentável desfecho por enquanto da questão da votação da emenda de redução da maioridade penal. Unanimidade contra essa medida em todas as cabeças esclarecidas e pensantes deste país, incluindo Caetano Veloso e Gilberto Gil, tivemos que passar pelo constrangedor desconforto de, na mesma semana, vivermos primeiro a alegria de ver a tal emenda recusada, para apenas algumas horas depois, ficarmos sabendo que por manobras manipulativas e perversas do Senhor Eduardo Cunha e seus comparsas brancos e ricos, a emenda voltou a ser aprovada. 

Num primeiro momento, eu, muito feliz por ver que a emenda não passou, fiquei perplexa de ver na televisão o Ministro da Justiça argumentando ser contra a redução da maioridade penal por não haver vagas nos presídios. Fiquei pasma! Ainda que vagas houvessem, a questão é que reduzir a maioridade penal jamais seria solução para a necessidade da sociedade oferecer aos nossos jovens condições sócio educativas e culturais para que se tornem cidadãos de bem, ao invés de trancafiá-los em presídios. Quem de nós não sabe que com a aprovação dessa emenda sofrerão represálias repressoras os jovens desfavorecidos negros e pobres enquanto os branquinhos riquinhos e perversos se beneficiarão dos estratagemas desonestos para se manterem em liberdade usufruindo dos privilégios que o dinheiro compra? Quem de nós não sabe que a aprovação dessa emenda daqui a 10 anos só terá agravado o panorama de desamparo estigmatizante que vivem hoje os nossos jovens menores de 18 anos? Quem de nós não sabe que o que os nossos jovens e crianças precisam é de garantia de saúde física e emocional, de educação, de condições sócio econômicas dignas?

A desonesta aprovação desta emenda, fere mortalmente a dignidade de todos os cidadãos que trabalham e lutam para que nossas crianças e jovens vivam sob condições sócio emocionais mais justas e humanas. Mas nem tudo está perdido. Amanhã parlamentares que se respeitam vão entrar com mandato de segurança para anular esse vergonhoso resultado. Mas nem tudo está perdido. Pude ver pelo Facebook inúmeras pessoas se manifestando veementemente contra a redução da maioridade penal. Em resposta à arbitrariedade de Eduardo Cunha e seus seguidores, consciências se formam, pessoas se posicionam num movimento social que vai crescendo.

Mas a direita reacionária não nos dá trégua. "É preciso estar atento e forte. Não temos tempo de temer a morte." Desde que abandonei a militância na minha adolescência, política não é mais o meu forte. Não dou conta de acompanhar o noticiário, fico às vezes confusa quanto a que posições adotar, e me tornei muito mais flexível quanto a acolher opiniões diferentes das minhas. Mas fiquei estarrecida ao saber que estavam à venda e sendo propagados adesivos pornográficos misóginos de agressão à presidente Dilma, numa postura de violência sexual raramente vista. Um violento desrespeito a todas as mulheres brasileiras. Não vou aqui entrar no mérito se simpatizo ou não simpatizo com a presidente Dilma. Não é disso que se trata. Numa sociedade que se preza, discordâncias políticas se expressam com argumentos políticos. Não com adesivos pornográficos e sexistas. Isso deveria ser punido como crime. Isso é crime.Eu não simpatizo nem um pouco com a Rede Globo com seu noticiário tendencioso e sensacionalista e fiquei indignada ao saber que Maria Júlia Coutinho, que atua na Globo, foi vítima de discriminação racial. Quando se trata da dignidade humana é preciso que um valor mais alto se levante. Do contrário, é a barbárie.

E pensar que esses tristes episódios aconteceram na semana em que se celebra a Independência da Bahia. Temos muito o que fazer, temos que arregaçar as mangas para falarmos com propriedade em independência. A propósito, estou triste com os acontecimentos na Grécia, antes de tudo, para mim, berço de nossa tradição filosófica. Comecei a ensaiar preparar um trabalho sobre o estado amoroso e para isso estou lendo o Seminário 8 onde Lacan, de certa forma, faz uma homenagem a Sócrates. Uma bela homenagem, diga-se de passagem.

Divagações. De vaga sons. De ondas amenas a alegre notícia do lançamento em São Paulo, no dia 17 de junho, do livro do amigo e grande poeta Carlos Machado, que edita e envia para vocês o boletim poesia.net. O livro de poemas de Machado chama-se "Tesoura Cega". Título no mínimo instigante para os psicanalistas que são chegados a um corte. Não vejo a hora de poder ler "Tesoura Cega". Com certeza, uma excelente contribuição para a literatura do Brasil e do mundo. Na onda das amenidades, saber que a Flip está acontecendo em Paraty, desta vez em homenagem a Mário de Andrade. Ai que vontade de ter ido à Flip!!! Bom também saber que a peça de teatro "A Alma Imoral" voltou a estar em cartaz em Salvador. Assisti no ano passado. É um monólogo de grande qualidade. Recomendo. Tenho um amigo querido que trabalha com teatro que está indo hoje ao espetáculo pela quinta vez.

Nas amenidades da onda, pensar em meus sobrinhos e sentir alegria por eles. Quase todo dia, me comunicar pelo Facebook com a doce Daniela. Dani é o meu xodó. Minha sobrinha mais velha, desde que nasceu, faz as vezes de filha. É a minha filhota por quem sinto grande orgulho. Um contentamento grande de saber que meu sobrinho Leandro Goddinho que vive em São Paulo trabalhando como cineasta, ganhou um prêmio de cinema e está indo morar na Alemanha. Meu reencontro com Íris (Iroca), outra sobrinha querida, aqueceu meu coração e me deixa muito grata. Iroca, que não abre mão de correr atrás de seus sonhos, estará provavelmente defendendo sua tese de doutorado agora em julho. Já ouvi dizer que quando o diabo nos tira os filhos, Deus nos manda os sobrinhos. Que Deus não é de deixar ninguém desamparado. A mim, menos ainda. Que além dos sobrinhos me deu um filho. Hoje está chegando Rafael, meu filho adotivo. Vem para compor uma banca de doutorado. Deve chegar todo feliz da vida com a visita da sua mulher em Porto Seguro.

Pois é. Leitores, amigos e colegas. Ondas tormentosas, graças à truculência arbitrária de um Eduardo Cunha. Mas há os sobrinhos e os filhos, e há, sobretudo, a esperança de com divagações dar uma trégua, para ainda que devagar, mergulhar em ondas mais amenas, e, acreditar num futuro digno e promissor para  nossas crianças e jovens, e para todos aqueles que de alguma forma, trabalham para construir uma sociedade mais justa.
                                                                                                              Marcia Gomes.

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