sábado, 5 de julho de 2014

29/06/14                                 O  OUTRO,  QUEM  É ???

As oscilações climáticas do mês de junho. Dias de sol intercalados por dias de chuva torrencial em Salvador. As oscilações de estados subjetivos de todo ser falante. Dias de júbilo por coisas da vida que vão dando certo. Dias de perplexidade diante das coisas que não dão muito certo e que não podemos controlar.

Razão de júbilo, parece que um encontro da turma de Psicologia que se formou em 76, vai assumindo contornos de possível realização talvez em início de novembro deste ano. Rever os colegas com os quais mantive frouxos laços de convívio. Poder dizer que se fosse hoje eu teria feito diferente. Quanta gente cuja fisionomia eu sequer me recordo.... No tempo da faculdade eu vivia num grupo muito fechado. Em torno de 40 anos depois, quero conhecer e reconhecer meus colegas. Quero também estar com aqueles com quem mantenho proximidade. São poucos, diante do tamanho da turma, mas muito queridos. Vai ser gostoso fazer uma espécie de "hora da saudade".

Há poucos anos atrás eu jamais me veria entusiasmada com a perspectiva de um encontro de turma. Não mexeria uma palha para que se realizasse e talvez torcesse o nariz na hora de ir. Talvez nem fosse, tão anti social que sou. Continuo tímida, um tanto avessa a situações sociais, mas o desejo de reconhecer aquelas pessoas agora se torna bem maior.

A ideia de fazer esse evento se delineou num encontro que tive com colegas, se não me engano, em abril deste ano. (Ver a crônica "O tempo, algoz? companheiro?" no blog:  blablablazista.blogspot.com.br ) . Na crônica eu relato o que esse encontro com o grupo de Dôra representou para mim. Saí desta tarde na casa de Dôra entusiasmada com a sugestão do grupo de fazermos o encontro e me mexi. Agora em junho, com o auxílio do espírito pragmático e colaborador da amiga e colega Bebel Drummond, estamos tentando dar uma arrancada no projeto.

Razão de júbilo, recebi inúmeros E-mails e alguns telefonemas de familiares, amigos e colegas agradecendo e se solidarizando pelo que escrevi sobre a visita à minha mãe e parentes próximos em Maceió. Fiquei comovida como aquele resgate tocou as pessoas.

Razão de júbilo, eu muito contente com o saldo positivo que a Copa do Mundo vai deixando. O sentimento de nacionalidade que transcende convicções políticas e partidos, o depoimento dos estrangeiros dizendo se sentirem seguros e bem acolhidos, os ganhos econômicos para o nosso país, a exemplo das obras que foram realizadas e ficarão para nosso usufruto, o recuo das investidas da direita diante da convicta expressão de patriotismo dada pelo povo brasileiro.

Torcer pela nossa Seleção, eu sempre torcerei. Mas estive sempre convencida de que deveria vencer o melhor. Essa é a maior demonstração dada pelo país de que ser brasileiro é antes de tudo cultivar o sentimento de justiça, torcendo para prosseguirmos na luta pela construção de uma sociedade mais igualitária nos direitos e mais respeitosa com a diversidade subjetiva.

Razão de perplexidade, saber que o Outro é inacessível. O Outro é uma suposição às vezes custosa, que está sempre a nos surpreender. Ter sempre que inventar, fazer um revestimento apaziguador diante desse fundo buraco que é a questão: o que é que o Outro quer de mim? E o que dizer quando o Outro silencia, não nos dá qualquer pista para que ao menos possamos nos implicar no que há de nossa participação no silêncio do Outro? Diante do longo silêncio do Outro, sem qualquer resposta, os apelos têm que cessar. E sobrevém a angústia. Angústia que precisa ser vivida sem culpa auto-referente. Angústia diante da constatação de que por mais que pensemos conhecer, não conhecemos o Outro. Angústia diante da constatação de que o Outro tem suas próprias questões e que por conta delas, talvez não nos responda.

Ter que inventar revestimentos para as abruptas, inesperadas mudanças de padrões do Outro. Suportar que nada podemos representar para ele. Suportar não correr o risco de converter suposições em certezas. O Outro é uma suposição às vezes custosa, sempre a nos surpreender e sobre isso não temos qualquer controle. Sobrevém o sentimento de perda, desaparelhados que às vezes somos, para fazer substituições imediatas. Viver um luto sem saber sequer se estamos efetivamente de luto. Cuidar de dar trégua a especulações catastróficas e aguardar. Somente aguardar.

A sensação de que em algumas relações de amizade vividas com intensidade e entrega, de repente não chegamos a lugar algum. Não há para onde caminhar. Como diz o escritor Jorge de Lima, "Também há naus que não chegam mesmo sem ter naufragado". Sensação de estar à deriva, cuidando de não naufragar. Não naufragar para permitir que a angústia da deriva possa se converter em desejo de uma outra coisa. Aproveitar a deriva para vislumbrar um novo porto não esperado. Escrever, não será vislumbrar um novo porto? Um novo porto onde possamos desembarcar e esculpir na areia da praia a palavra "outro" com minúscula. Enxugar o poder do outro, desinflar. Conviver, ainda que sob frustração, ainda que sob desapontamento, com a pergunta irrespondível: "O Outro, quem é?" O Outro é o outro. E prosseguir.

Por um longo e inquietante tempo, interrompo a escrita desse texto para assistir aos jogos do Brasil contra o Chile e da Colômbia contra o Uruguai. Por um longo tempo, dou uma trégua para as minhas especulações subjetivas que podem até ser chatas para o leitor. O jogo da Seleção foi um sufoco para todos nós. Na minha opinião de leiga o Brasil jogou muito mal. Não fosse o goleiro.... Fiquei contente por meu filho adotivo com a vitória da Colômbia. O Brasil jogou mal mas a torcida em todo o país foi de uma tenacidade comovente!!! Responde, grita, não entrega os pontos. "Ô, ô, ô, o campeão voltou!".  O sentimento de nacionalidade me toma inteira. Com meu boné com a bandeira do Brasil, passo um longo tempo sendo pura adrenalina. Como amamos este país, transcendendo convicções políticas!!! Por um longo tempo, dou uma trégua às minhas especulações subjetivas. Por um longo tempo construo a fantasia alvissareira de que o Outro é meu povo brasileiro. E vou em frente!!!!
                                                                                       Marcia Gomes.

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