Texto de 26/05/2013
“Blá, blá, blá domingueiro...” e... "Sessentanos".
Nota ao leitor: O "Blá, blá,
blá....." é um escrito em geral semanal, com modestissíssimas pretensões
literárias, em prosa. Chegando perto talvez de uma crônica, costuma ser um
texto cheio de livres associações viajando por diferentes tempos.Pode
(costuma) incluir informes autobiográficos, percorre histórias consideradas
ternas ou pitorescas,contemplando muitas vezes impressões, sentimentos, modos
de ver o mundo desta autora.
Por minha absoluta resistência ignorante
em relação aos recursos internéticos, escrevo o "Blá, blá, blá..."
sob a forma de e-mail. Nas primeiras vezes enviei a poucas pessoas. Muitas dessas
poucas me deram retorno dizendo terem gostado do escrito. Então resolvi ampliar
o envio para uma lista grande de pessoas.Gosto que meu texto chegue a vocês e
gosto também de receber retornos de como foi esta chegada.
Blá, blá, blá, domingueiro e....."Sessentanos".
Foi ainda ontem à noite. Sábado à noite ainda. Uma noite jovial. Quantas noites
num pequeno texto! A lua, imensa, causava escândalo ao negror do céu com a sua
face de luz branca nada virginal. Que digam os amantes.
Hoje, já um dia envelhecido pelos tons
plúmbeos ensombrecendo o céu. O tempo senilizou-se de ontem pra hoje. Eu
também. Recordo, era ainda quase ontem quando eu andava pela Alameda Lorena de
braços dados com um escritor, entoando juntos a canção do filme "Cantando na
Chuva".Eu não tinha sessenta anos. Fui com ele, o escritor, ao sítio de
Hilda Hilst. Creio que era em Campinas. Na noite anterior quase não dormi.Não é
todo mundo nem todo dia que se vai à casa de Hilda Hilst. Muitos bichos,
aparelhos espalhados pelo sítio para captar a voz dos mortos no sítio de Hilda
Hilst. Eu, calada, encantada, enfeitiçada pela conversa dos dois no sítio de
Hilda Hilst. Se duvidar Hilda Hilst é o meu escritor mulher brasileiro
preferido.Preferida.Quando cheguei de São Paulo aqui, não havia seus livros
nas livrarias.Que ódio! Mortal.
Agora, eu fazendo "sessentanos",minha amiga Ana Cecília que além
de professora universitária é principalmente poeta, pra me fazer um agrado, me
envia por internet a obra completa de Hilda Hilst. Acreditem! Respondo que
preciso melhorar da minha dor para ler o que ela me enviou. Fazer sessenta anos
é tornar-se insensível aos amigos?
Apenas doze anos.Eu contava.A professora de Português do colégio público
distribuiu um texto intitulado "Conversa de velho com criança".Era o
meu Drummond.O parceiro masculino de Hilda Hilst na minha predileção.A minha
mãe me presenteou com as obras completas.Li tudo aos doze anos.Nunca mais me
esqueci daquela professora que me apresentou e deixou para o resto da minha
vida aquela presença cálida, tímida, mineira do arauto da bela palavra.
Agora, eu fazendo "sessentanos", recebo de empréstimo de uma pessoa
que me quer bem um livro com a biografia de Drummond. Dias depois devolvo
explicando que a minha perda visual só me permitirá ler depois que eu fizer
novos óculos.Fazer sessenta anos é tornar-se insensível com aqueles que nos
querem bem e reconhecem nossas predileções?
De ontem pra hoje, talvez sob a inspiração da lua e indiferente ao senilizar-se
do tempo, sonhei que estava com uma amiga na Serra da Cantareira lendo (e
enxergando muito bem) poemas de Cesar Valejo, outro escritor que adoro.Do livro
aberto, cai sobre uma pedra um bilhete do meu amante com o seguinte
texto:"quando você chegar em "MEU PAI É UMA JANEIREIDA",nos
encontraremos e faremos amor".Folheio rapidamente o livro e feliz da vida
encontro a linda frase de Cesar Valejo:"Meu pai é uma
janeireida"(agora em letra minúscula).Acordo feliz e penso:"O
inconsciente é atemporal".No dia 19 de junho , quem sabe, renascerei?
Marcia Gomes.
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